domingo, 1 de junho de 2014

O zelo de uma alma humilde...

Cap XIV - Que a alma humilde está sempre zelosa por ocultar aos olhos dos homens o que vale para os olhos de Deus.

   
     
    O anjo enviado pelo Senhor tecera à Maria os maiores elogios, anunciando que se tornaria a Mãe do Filho de Deus. Mas ninguém soube dos lábios de Maria o que o Anjo falara. Ninguém a viu exibir-se por demonstrar em público, deste ou daquele modo,  a sua qualidade de Mãe do Messias. Continuou a comportar-se qual se fora uma criatura vulgar.
 
    Ainda que terna a sua afeição para José, seu esposo, e muito íntima que fosse a caridade de ambos os corações, a José nunca falou Maria sobre as palavras do anjo. Quando da visita à Isabel, já esta se encontrava ciente do mistério. Maria, porém, não aproveitou dessa favorável circunstância para ainda mais instruir a prima, senão que a Deus deixava o cuidado de manifestar, quando julgasse oportuno,os segredos que tão gloriosos lhe eram.
     Toda a aplicação do seu espírito estava no constantemente se ater a sua própria humildade. Assim, aos olhos dos homens, oculto havemos de ter o que formos aos olhos de Deus, bem como o que de sua liberdade recebermos. Uma virtude escondida sempre se acha em maior segurança.
      Só a Deus compete "tirar a luz debaixo do alqueire e pô-la sobre o candelabro".
Quem quer que exponha aos olhos de todos o seu tesouro, arriscar-se-á a perdê-lo. Até as cores mais firmes não resistem por muito tempo ao ar livre, senão que cedo esmaecem. Marta diz à sua sua irmã: "aí está o Mestre, e ele te chama." (Jo. 11, 28), mas é em voz baixa que  assim fala. Os homens, sempre cegos e sensuais, não estimam ou mesmo não concebem o que está acima dos sentidos, o que é do espírito de Deus (1 Cr. 2,14). A tais homens falar dessas coisas é expor aos seus motejos o que há de mais santo.
     Em segredo é que se comunica o Espírito de Deus. Por isso, Ele quer que a alma favorecida conserve em segredo todos os favores recebidos. "Só um homem entre mil homens escolhido." (Es. 7, 29) pode e deve mesmo conhecer as tuas riquezas espirituais, afim de que te ensine a delas usares com proveito.
     O que é neste mundo ministro de Deus, só este, tem o direito de te instruir e conduzir pelos caminhos da salvação e da perfeição. Quanto aos outros, seja diante deles o teu exterior como o das pessoas virtuosas: humilde, modesto, afável, igualmente humorado, porém fechado conserva sempre o teu interior. Que mesmo te julguem pouco integrado na vida espiritual, bem diferente mesmo do que és, recebe isso como feliz precaução para te conservar em lugar seguro as graças concedidas por Deus.
    Com ardor deseja Deus que palmilhemos os seus caminhos. Porém grande vantagem há em caminharmos sem ruidosos sinais de nossa presença. Não poucas almas, depois que de Deus receberam favores singulares, logo se perderam por muitas reflexões a esse respeito, exercitando-se em vãs complacências, tornando-se motivos de admiração para os que não as deveriam conhecer jamais.
    Se aquelas almas tivessem a interior disposição da Santa Virgem, esse espírito de humildade, que traz sempre consigo centelhas de luz divina, teriam numa prudente desconfiança o meio infalível de vencer a tentação do espírito da soberba. Nunca será demasiada a precaução que tiveres por te não enganares na vida espiritual, máxime nos casos extraordinários. Se te faltar esta precaução, o mais celestial licor poderá transforma-se em mortalíssimo veneno. 

  (Imitação de Maria, por um Religioso anônimo, 1938)

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